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INTRODUÇÃO
Os fatores que envolvem o posicionamento do adjunto adnominal na oração envolvem um fenômeno curioso, que me chamou atenção e despertou em mim a vontade de escrever este artigo. A consequente transformação dos sujeitos e dos adjuntos adverbiais da oração base em adjuntos adnominais, a partir da nominalização dos verbos transitivos, foi um dos principais pontos motivadores de pesquisa, uma vez que tal fenômeno seria indício da possibilidade de o adjunto adnominal se posicionar distantemente do nome.
O objetivo deste estudo é, portanto, investigar o comportamento do adjunto adnominal, especificamente os fatores que envolvem o posicionamento desse termo acessório na oração;
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ADJUNTO ADNOMINAL (AADN) – DEFINIÇÃO
Antes de adentrar nos estudos que envolvem o conceito de adjunto adnominal, há de se destacar que, nas categorias das funções sintáticas, é consensual entre os gramáticos tradicionais a classificação dessa função como termo acessório da oração.
Em termos conceituais, elege-se como parâmetro inicial desta análise a acepção gramatical de Caldas Aulete (2011, p. 46), segundo a qual adjunto adnominal é a “palavra ou expressão com função adjetiva, que especifica ou delimita o significado de um substantivo”. (grifo meu).
Em consonância com esse verbete, Cunha e Cintra (2017, p. 164) afirmam que: “Adjunto adnominal é o termo de valor adjetivo que serve para especificar ou delimitar o significado de um substantivo, qualquer que seja a função deste.”
Na mesma linha de entendimento, Cegalla (2010, p. 363) define adjunto adnominal como o termo que caracteriza ou determina os substantivos, o qual pode ser expresso pelos adjetivos, artigos, pronomes adjetivos, numerais e locuções ou expressões adjetivas que exprimem qualidade, posse, origem, fim ou outra especificação.
Para Evanildo Bechara (2015, p. 467), os adjuntos adnominais são determinantes que têm por missão acrescer ideia acidental complementar ao significado do substantivo nuclear, de forma a expandir tal expressão nominal, independentemente da função do seu núcleo.
Ainda sob essa mesma concepção, Rocha Lima (2011, p. 314) define o adjunto adnominal como termo de valor adjetivo que complementa o significado do núcleo substantivo com um dado novo.
Diante das definições apresentadas, fica evidente que não há divergências entre os autores quanto ao conceito de adjunto adnominal. Todos reafirmam o valor adjetivo inerente a tal função sintática. Suas definições variam apenas quanto aos termos (geralmente sinônimos) empregados para descrever a atuação do adjunto adnominal sobre o substantivo, quais sejam: “especificar”, “delimitar”, “complementar”, “caracterizar”, “determinar” e “acrescer”.
Ademais, é consenso que o adjunto adnominal pode ser expresso por adjetivos, locuções ou expressões adjetivas, artigos e pronomes ou numerais adjetivos.
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POSICIONAMENTO DOS ADJUNTOS ADNOMINAIS NA ORAÇÃO
O propósito aqui é investigar os fatores relacionados ao posicionamento dos adjuntos adnominais na oração. Tal estudo parte da observação de que a nominalização dos verbos transitivos resultam na transformação dos sujeitos e dos adjuntos adverbiais da oração base em adjuntos adnominais.
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Análise
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Quando se pensa no termo adjunto adnominal, a primeira ideia que surge, antes mesmo de se cogitarem palavras ou locuções especificadoras ou delimitadoras do significado de um substantivo, é a da proximidade existente entre o referido termo e o substantivo. Sobre esse tema, José de Nicola (2012, p. 423) faz a seguinte afirmação: “O adjunto adnominal, seja ele representado por um adjetivo, um artigo, um pronome ou um numeral, por gravitar em torno de um substantivo, é uma função adjetiva da oração.” (grifo meu). Ademais, considerando-se a origem do termo adjunto adnominal, tem-se que ad, em latim, significa ao lado de, ou seja, é um termo ou locução que está junto (adjunto), ao lado de um nome (adnominal).
Sob esse ponto de vista, do adjunto adnominal preso ao nome, surge a questão sobre os posicionamentos que ele, de fato, assume nas orações e sobre as situações linguísticas que implicam essa mobilidade.
Segundo Luft (2015, p. 7-9), a nominalização dos verbos transitivos resulta na transformação dos sujeitos e dos adjuntos adverbiais em adjuntos adnominais. Tal afirmação foi um dos pontos que instigaram a escolha desse tema, uma vez que a transformação de adjuntos adverbiais e sujeito da oração básica em adjuntos adnominais seria indício da possibilidade de o adjunto adnominal se posicionar distantemente do nome. Além disso, esse fenômeno indica que o posicionamento do adjunto adnominal pode ser influenciado pelo fato de o nome (a que se refere o adjunto) ser de primeira, de segunda ou de terceira classe (categorias definidas por Luft).
Assim, com base na teoria de Luft (2015), procurou-se pesquisar e extrair dos textos escolhidos (conteúdos aleatórios retirado de jornais on-line) não só as ocorrências clássicas do adjunto adnominal (relativas a nomes não transitivos), como também aquelas decorrentes de nomes derivados ou cognatos de verbos, os quais, segundo o autor, constituem a primeira classe de nomes transitivos. Para fins de estudo comparativo, focalizaram-se, também, estruturas com nomes pertencentes à segunda e à terceira classe de nomes transitivos. Tais ocorrências estão relacionadas no Quadro 1.
Quadro 1 – Possíveis ocorrências do adjunto adnominal
Item | Excerto | Ocorrência | Oração Básica | Análise quanto à classe de nome transitivo | Observação |
1 | …alta de 5,1% nas cotações autorizada na véspera… | N + CN + AAdn + AAdn | As cotações aumentaram 5,1% com autorização na véspera. | 1ª Classe nominalização baseada no verbo aumentar. | – O AAdn é separado do nome por um CN. – Semanticamente, pode-se considerar que o nome está estritamente ligado ao termo aumento, que é uma nominalização do verbo aumentar. – VT. |
2 | …mudanças até diárias das cotações. | N + AAdn + AAdn | As cotações mudavam até diariamente. | 1ª Classe Nominalização do verbo mudar. | – os AAdn se posicionam ao lado do nome. – VI. |
3 | …perda de participação no mercado doméstico de combustíveis [pela Companhia]. | N + CN + [AAdn] | A companhia perde participação no mercado doméstico de combustível. | 1ª Classe Nominalização do verbo perder. | – O AAdn é separado por CN. – VT. |
4 | …aumento de 0,2% do diesel válido a partir desta quinta-feira. | N + CN + AAdn + AAdn | O diesel aumentará 0,2% com validade a partir desta quinta-feira. | 1ª Classe Nominalização do verbo aumentar. | – O AAdn é separado do nome por um CN. – VT. |
5 | Sucesso em séries cômicas de televisão no Brasil e no exterior. | N + CN + AAdn | *** | 3ª Classe Substantivo (sucesso) | – O AAdn é separado do nome por um CN. |
6 | Limitação grande para colher informações. | N + AAdn + CN | *** | 3ª Classe Substantivo (limitação) | – O AAdn se posiciona ao lado do nome. |
7 | …o trabalho dos detetives. | AAdn + N + AAdn | Os detetives trabalham. | 1ª Classe Nominalização do verbo trabalhar. | – os AAdn se posicionam ao lado do nome. – VI. |
8 | A sua própria agência de investigação. | AAdn + AAdn + AAdn + N + AAdn | *** | Não se trata de nome transitivo. | – Os AAdn se posicionam ao lado do nome. |
9 | Com relação à vida conjugal. | N + CN | *** | 3ª Classe Advérbio (com relação/relativamente) | – Não há AAdn, pois na frase só há o complemento do nome (advérbio) transitivo. |
10 | Autorização expressa do cliente e da polícia [a atuar em caso criminal]. | N + AAdn + AAdn + [CN] | O Cliente e a polícia autorizam expressamente [a atuar em caso criminal]. S + VT + AAdv + CV | 1ª Classe Nominalização do verbo autorizar. | – Os AAdn seguem o nome, pois o CN só consta no final da oração. – VT. |
11 | Autorização expressa, por escrito, dos clientes [a usar escutas e outras ferramentas de monitoramento]. | N + AAdn + AAdn + AAdn + [CN] | Os clientes autorizam expressamente, por escrito [a usar escutas e outras ferramentas de monitoramento]. | 1ª Classe Nominalização do verbo autorizar. | – Os AAdn seguem o nome, pois o suposto CV só consta no final da oração básica. – VT. |
12 | Uso crescente da tecnologia em investigações particulares. | N + AAdn + CN + AAdn | [As pessoas] usam de forma crescente a tecnologia em investigações particulares. [S] + VT + AAdv + CV + AAdv | 1ª Classe Nominalização do verbo usar. | – Há AAdn separado do nome por um CN. – O CV consta antes de um AAdv na oração básica. – VT. |
13 | A divulgação não autorizada da intimidade sexual [por alguém]. | AAdn + N + AAdn + CN + [AAdn] | [Alguém] divulga sem autorização a intimidade sexual de uma pessoa. | 1ª Classe Nominalização do verbo divulgar. | – Há AAdn separado do nome por um CN; – O suposto sujeito da oração básica surgiria como AAdn no final da oração com o verbo nominalizado. |
14 | Vítimas de crimes. | N + CN | *** | 2ª Classe Adjetivo (vítima). | – Não há AAdn. |
15 | Provas contra o ex-noivo. | N + CN | *** | 3ª Classe Substantivo (provas). | – Não há AAdn. |
16 | Apoio a mulheres em situações semelhantes. | N + CN + AAdn | [A ONG] apoia mulheres em situação semelhante. [S] + VT + CV + AAdv | 1ª Classe Nominalização do verbo apoiar. | – O AAdn é separado do nome por um CN. – VT. |
17 | Reencontro do Supremo com a opinião pública. | N + AAdn + CN | O Supremo se reencontra com a opinião pública. | 1ª Classe | – O AAdn se posiciona ao lado do nome. – VT. |
18 | Garantia da igualdade para o político… | N + CN + CN | Garantir a igualdade para o político. | 1ª Classe Nominalização do verbo garantir. | – Não há AAdn, pois na oração básica não há AAdv, nem S. |
19 | O Juiz fica vulnerável à pressão. | N + CN | *** | 2ª Classe Adjetivo (vulnerável). | – Não há AAdn. |
20 | Certeza de que vai dar a celeridade… | N + CN | *** | 2ª Classe Adjetivos/derivados (certo/certeza). | – Não há AAdn. |
21 | Tudo o que é importante para o País. | N + CN | *** | 2ª Classe Adjetivo (importante). | – Não há AAdn. |
22 | Medidas cautelares diversas da prisão são aplicáveis a todos. | N + CN | *** | 2ª Classe Adjetivo (aplicáveis). | – Não há AAdn. |
23 | A luta pela conquista de direitos pelos cidadãos. | AAdn + N + CN + AAdn | Os cidadãos lutam pela conquista dos direitos. | 1ª Classe Nominalização do verbo lutar. | – O AAdn é separado do nome por um CN. – VT. |
24 | Punição àqueles que desrespeitassem os direitos humanos. | N + CN | Puniriam aqueles que desrespeitassem os direitos humanos. | 1ª Classe Nominalização do verbo punir. | – Não há AAdn, pois na oração básica não há AAdv, nem S. – VT. |
25 | Luta das minorias étnicas nos Estados Unidos e em outras partes. | N + AAdn + AAdn | As minorias étnicas lutam nos Estados Unidos e em outras partes. | 1ª Classe Nominalização do verbo lutar. | – O AAdn se posiciona ao lado do nome. Não há CN, uma vez que o verbo na oração básica é intransitivo. – VI. |
26 | Nova política de preços da estatal. | AAdn + N + AAdn + AAdn | *** | Não se trata de nome transitivo. | – Os AAdn se posicionam ao lado do nome. |
Legenda: Adjunto adnominal na nominalização / Adjunto adverbial ou sujeito na oração básica.
Complemento nominal na nominalização / Complemento verbal na oração básica.
Nome na estrutura nominalizada / Verbo na oração básica.
Fonte: elaborado pela autora, com base nas gramáticas citadas nas referências.
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Resultado da análise
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A análise das ocorrências do adjunto adnominal permitiu as seguintes constatações:
- Nos itens 1, 3, 4, 5, 12, 13, 16 e 23 do Quadro 1, em que os nomes pertencem à primeira classe (à exceção do item 5, que é de terceira classe) há ocorrências de adjunto adnominal distante do nome, separado por complemento nominal.
- Nos itens 10, 11, 17, 18 e 24, em que os nomes são de primeira classe, não há ocorrência de adjunto adnominal distante do nome, ou porque o complemento nominal vem no final da frase, ou porque sequer há adjunto adnominal na frase.
- Nos itens 2, 7 e 25, embora os nomes pertençam à primeira classe, não há ocorrências de adjunto adnominal distante do nome (separados por complemento nominal), uma vez que os verbos das respectivas orações básicas estão empregados como intransitivos, o que implica a ausência de complemento nominal nas orações nominais (com verbos nominalizados).
- Nos itens 14, 19, 20, 21 e 22, em que os nomes são de segunda classe, não há sequer a presença de adjunto adnominal.
- Nos itens 6, 9 e 15, em que os nomes são de terceira classe, não há ocorrência de adjunto adnominal distante do nome, ou porque o complemento nominal vem no final da frase, ou porque não há adjunto adnominal.
- Os itens 8 e 26 mostram o caso mais simples de adjunto adnominal, que envolve nomes não transitivos. Nesse caso, os adjuntos adnominais situam-se todos ao lado do nome a que se referem, já que não há complemento nominal para separá-los.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em face dessas constatações, compreende-se que os adjuntos adnominais podem aparecer posicionados não só ao lado do nome (ou seguinte a um adjunto adnominal já ligado ao nome) como também em posições distantes do nome a que se referem, separados por um complemento nominal.
Ressalta-se que essa possibilidade de separação por complemento nominal aplica-se a estruturas com nomes transitivos de primeira classe (verbos nominalizados) e a situações bastante específicas de nomes transitivos de terceira classe (substantivos). Nesse sentido, cabe esclarecer que nem todas as ocorrências de adjunto adnominal formado com nome de primeira classe implicarão tal posicionamento (separados do nome por complemento nominal), ou porque o complemento nominal virá no final da frase, ou porque não haverá adjunto adnominal ou, ainda, pela possível ausência de complemento nominal (presença de verbo intransitivo na oração básica).
Em se tratando dos nomes de segunda classe, o que se pode observar, a partir da análise dos dados coletados, é que a ausência de adjuntos adnominais nessas estruturas é justificada pela similaridade existente entre os adjuntos adnominais, cuja função é adjetiva, e os nomes de segunda classe, que são adjetivos transitivos.
Já em relação aos nomes não transitivos, os adjuntos adnominais localizam-se sempre ao lado do nome a que se referem, pois nesse tipo de estrutura não há complemento nominal para separá-los do nome.
REFERÊNCIAS
BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 38. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2015.
CALDAS AULETE. Novíssimo Aulete: dicionário contemporâneo da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Lexikon, 2011.
CEGALLA, Domingos Paschoal. Novíssima gramática da língua portuguesa. 48. ed. revista. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2010.
CUNHA, Celso; CINTRA, Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. 7. ed. Rio de Janeiro: Lexikon, 2017.
LUFT, Celso Pedro. Dicionário prático de regência nominal. 5. ed. São Paulo: Ática, 2015.
NICOLA, José De. Gramática: palavra, frase, texto (aluno). 2. ed. Rio de Janeiro: Scipione, 2012.
ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. Gramática normativa da língua portuguesa. 49. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2011.
Veja também ADJUNTO ADNOMINAL VS. COMPLEMENTO NOMINAL.
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