Gardênia

Raquel M. Pivetta

Gardênia era uma mulher bonita, recatada e extremamente supersticiosa. Morava sozinha, em uma pequena cidade de interior. Ela levava realmente a sério suas crendices. Evitava passar por baixo de escadas, deixar o chinelo virado pra baixo, abrir guarda-chuva dentro de casa e até mesmo cortar as unhas à noite, tudo por medo de atrair má sorte. Além de acompanhar o horóscopo, ela, como bióloga especializada em botânica, era apaixonada por jardinagem, de modo que passava horas cuidando de suas plantas.

Certo dia, ao caminhar por entre as orquídeas, Gardênia encontrou no chão um papel enrolando, preso por uma fita vermelha — era tudo que ela precisava para mergulhar de vez no mundo dos presságios. A partir desse dia, Gardênia não foi mais vista pela vizinhança. Dizem as más línguas que ela esqueceu de botar a vassoura atrás da porta, e os bandidos a visitaram.

Não. Gardênia não cometeria um erro como esse. O fato é que aquele papel encontrado próximo a seu jardim despertou em Gardênia profunda sensação de fascínio. Ela inferiu que era um sinal do universo. Sem hesitar, levou o item misterioso para dentro de casa, colocou-o sobre a mesa de cabeceira e ficou aguardando ansiosamente pelo momento da revelação.

Os dias se passaram e Gardênia, em vez de abrir o papel, dedicou-se inteiramente a interpretar aquele “sinal”. Ela consultou suas cartas de tarô, buscou conselhos nos astros e até recorreu à leitura das folhas de chá. No entanto, cada tentativa de decifrar o enigma só resultou em frustração.

Finalmente, após semanas de especulação, Gardênia decidiu que era hora de desvendar o mistério de uma vez por todas. Com um misto de excitação e apreensão, desenrolou o canudo e observou seu teor atentamente.

Ficou em silêncio por um momento, processando aquela fórmula tão bem demonstrada com a qual se deparara. Gardênia captou o recado nas entrelinhas e sentiu uma mudança dentro de si. Mas não revelou a ninguém o que continha aquele bendito papel.

O que se sabe é que, a partir desse dia, algo mudou em sua maneira de enxergar algumas coisas. Sua vida tomou um rumo diferente. Não demorou para Gardênia se ver envolvida em um relacionamento sincero com Lucas, professor de física, conhecido por sua visão cética do mundo. As flertadas que vinha trocando ocasionalmente com esse homem tímido ganharam mais profundidade e com o tempo Gardênia começou a perceber que Lucas trazia mais coerência e leveza para sua vida.

Ao olhar para trás, sempre se lembraria daquele bilhete encontrado no chão como o ponto de virada que a levou não só a compreender a Lei de Coulomb, que calcula a força elétrica entre duas cargas, como também a descobrir que o amor é a força mais poderosa que existe. Einstein estava certo quando intuiu que esse sentimento é a maior força motriz para a cura da humanidade.

É bem verdade que os opostos se atraem. E é impressionante o poder do amor para superar as barreiras das diferenças e transformar vidas. O amor tem dessas coisas.

Veja também: Pinceladas do destino

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2 respostas

  1. Oi Raquel,

    Mais uma vez você nos brinda um conto que nos envolve em um mistérios e nos dar uma revelação bem diferente do que poderíamos imaginar. Parabéns. Mais um belo conto que expressa muito bem o seu talento bem como a sua visão do comportamento humano. Abraços.

  2. Oi Raquel,

    Mais uma vez você nos brinda um conto que nos envolve em um mistérios e nos dar uma revelação bem diferente do que poderíamos imaginar. Parabéns. Mais um belo conto que expressa muito bem o seu talento bem como a sua visão do comportamento humano. Abraços.

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