Comédia da vida no trabalho
Raquel Pivetta
Num escritório, bem ali naquele cantinho onde a expectativa de produtividade é arrastada pelos ventos da procrastinação, há uma fauna peculiar de funcionários. Em meio ao frenesi dos teclados e ao aroma de café queimado, eis que emergem os quatro perfis de empregado:
Um deles é o “astuto”, mestre das artimanhas. Extremamente divertido e cativante, esse perfil é o mais inventivo, cheio de desculpas bem elaboradas, dignas de um prêmio literário. Ele é capaz de inventar uma doença e driblar tudo à sua frente para escapar de entrar pelo INSS. Sua lista interminável de estratégias daria um manual de malandragem.
Em seguida, está o “malabarista das leis trabalhistas”. Ah, esse é o rei dos benefícios, o sultão dos direitos do trabalhador, convertendo cada cláusula em uma fonte de vantagem pessoal. Ele conhece as leis e as normas internas da empresa com a palma da mão e as manipula a seu favor. Sabe de cor todos os feriados do ano que vão cair em dia útil e já vai se programando — bem proativo nesse aspecto! Esse tipo é o mais difícil. Para lidar com as questões dele, seu gestor tem que pisar em ovos. Quando esse funcionário vai a uma consulta de quinze minutos e ganha um atestado sem indicação do horário, só aparece no escritório no dia seguinte. Também vive implorando folgas ao chefe — é o aniversário do cachorro, é a viagem que já está marcada… Enfim, sua jornada de trabalho se assemelha a uma aventura na montanha-russa, em que as curvas e descidas são substituídas por folgas e vantagens legais que nunca têm fim.
Diante desse cenário caótico, encontramos o “sensato e comprometido”. Em meio à tempestade, no vasto oceano dos absurdos, ele segue com sabedoria. Não só respeita a lei, como veste a camisa da empresa. Consultas? Ele as marca com precisão cirúrgica, no início ou no final do expediente, para não queimar um turno inteiro de trabalho. Atestados? São lançados com a honestidade de um livro contábil. Ele também se esforça para minimizar o impacto dessas saídas nos dias mais agitados. Esse perfil é o expert das tarefas, o guardião do comprometimento e geralmente é o mais saudável.
Por último, vem o “Otário”. Ah, esse pobre coitado trabalha doente, enfrentando bravamente o resfriado, como um guerreiro em batalha. Atestados médicos? Ele os guarda como tesouros, mas nunca os apresenta. Prefere se virar depois para compensar o período de ausência. Esse é o tipo que nunca pede folga, sempre se desdobra para estar presente no trabalho. Ele é o herói desconhecido. Normalmente, o profissional menos reconhecido. Os colegas, inclusive os chefes, não costumam apreciá-lo, pois sua diligência ressalta as faltas dos demais, eleva muito o nível. Sempre presente, ele brilha como uma estrela solitária no firmamento da dedicação. Assim, sua luz resplandece sem alarde.
E é na cumplicidade do cafezinho que esses quatro perfis se reconhecem como personagens, rindo das contribuições de cada um para o cotidiano da empresa — nessas horas, até o “otário” se diverte. Dessa forma, entre faltas descaradas, regalias, compromissos e sacrifícios, o escritório se torna o palco de um espetáculo em que cada ator exerce seu importante papel na comédia da vida no trabalho.
Veja também: Modéstia à parte
3 respostas
Raquel,
amei seu blog.
Parabéns!
Desejo sucesso sempre.
Um forte abraço.
Muito obrigada, Eloína! Fico feliz que tenha gostado.
Bjs.
Oi Raquel,
Curiosamente tenho a impressão que esses quatros personagens são bem conhecidos, mais deixa pra lá. Excelente. Parabéns.