A fria realidade de Sueli
por Raquel Pivetta
Está para nascer uma pessoa mais friorenta do que a Sueli. E o pior é que ela se senta debaixo de um ar-condicionado poderoso, cujo vento gelado parece penetrar até a alma. Enquanto seus colegas de trabalho enfrentam a situação com um simples casaco, Sueli se enrola dos pés à cabeça num cobertor e ainda fica praticamente congelada ao longo do dia.
Para Sueli, o ar-condicionado nada mais é do que um dispositivo de tortura do escritório. Chegou a oferecer dinheiro para quem trocasse de lugar com ela. Ninguém aceitou — mas também, a mesa dela é virada para o corredor… Nenhum colega toparia se sentar ali, nem que sua oferta fosse em bitcoin ou em likes nas redes sociais.
Certa manhã, o ar-condicionado resolve sair do ar. Não funciona de jeito nenhum. Nesse dia — justo nesse — Sueli tem consultas e exames marcados para a tarde inteira. Mas ela ainda pode contar com os próximos dias para aproveitar a trégua do frio, já que a equipe de manutenção costuma demorar uma eternidade para consertar aquela engenhoca. Isso quer dizer que, pelo menos por um tempo, ela estará livre desse tormento.
Porém, para o azar de Sueli, o ar volta no dia seguinte. Nunca o ressuscitaram tão depressa. E o dito cujo volta com força total! Assim, Sueli permanece angustiada em seu canto gelado, onde mal consegue se concentrar.
— Eu ainda dou um jeito nisso! — murmura Sueli, que sonha em um dia encontrar uma maneira de escapar dessa fria.
Especialista em Engenharia de Climatização, Sueli já se prontificou várias vezes para ajudar a solucionar o problema crônico no sistema de ar-condicionado da empresa, mas naquele lugar ninguém dá ouvidos às suas ideias.
Eis que, numa manhã de segunda-feira, o milagre do ar acontece. Ela percebe que o ar-condicionado entrou nos trilhos. Passou a funcionar direitinho, ajustando-se perfeitamente às necessidades de cada repartição. Finalmente, um ambiente confortável! Sueli não consegue esconder sua felicidade. Tantos anos de sofrimento, ouvindo os técnicos sempre afirmarem que não havia solução…
No dia seguinte, ao entrar no elevador, Sueli é abordada pela colega de trabalho:
— Bom dia, Sueli!
— Bom dia!
— Tudo bem contigo? — pergunta Fernandinha, com curiosidade evidente. — Fiquei preocupada, você não veio ontem…
— Tudo bem… Ah, estão me ligando do seguro, depois a gente conversa — diz Sueli, atendendo o celular.
O dia passa e nada de Sueli tocar no assunto. O que exatamente aconteceu com ela naquela segunda-feira permanece um mistério. Boatos que circulam pelos corredores da empresa sugerem que, nesse dia, ela desceu no andar errado e, sem se dar conta, trabalhou o dia todo na sala da diretoria ligada à presidência. Dizem até que, ao final do expediente, ela entregou um relatório sobre produtividade no ambiente de trabalho que deixou a diretora impressionada.
Parece que foi um golpe de sorte. Mas há quem acredite que tenha sido um plano orquestrado pela Sueli, friamente calculado desde o início.
Veja também: Inveja
3 respostas
Parece com alguém que conheço, mas acho que é mera coincidência kkkk
Parabéns, Raquel.☃️
Hummm… parece que temos uma “Sueli da vida real”!?
Girlei, agradeço sua visita ao blog. Continue acompanhando as crônicas para mais surpresas e coincidências divertidas!
Abraço,
Raquel
Oi Raquel,
A Sueli no final entrou num estado de graças. Saiu de uma fria. Muito bom parabéns. Conhecemos tantas Suelis, inclusive ai pertinho. Um abraço. Muito bom.